Eleven e os “5 Best” de Nova York

[5 abr 2017 | Pedro Mello e Souza | Sem comentários ]

Este post é a íntegra da matéria publicada pelo caderno ELA Luxo, em O Globo, em janeiro de 2014, em que visitamos, Ana Cristina Reis, Luiz Carlos Ritter e este crítico, os cinco melhores restaurantes de linha francesa em Nova York.

Se, hoje, o Eleven está no topo da lista do 50 Best Restaurants, é provável que alguns dos motivos estejam aqui, na experiência que registramos na íntegra em imagens e saborosas exclamações.

Eleven Madison Avenue: humor necessário na cozinha e na mesa (Foto: Pedro Mello e Souza)

Há quem proteste contra a mudança de perfil do restaurante Eleven Madison Avenue,  batizado com o seu endereço, na antiga agência de um banco suíço. Era à la carte, mas o chef Daniel Humm mudou tudo e passou a mostrar o que sabe em um cardápio-degustação de 17 pratos. São 22, na realidade, se considerarmos as pequenas brincadeiras que chegam no ambiente de meia luz, de pé-direito altíssimo e que, à noite, lembra um pouco a nossa Confeitaria Colombo.

 

O esquema é intenso e já diante do livro de reservas, o cliente já ganha seu pacote de cookies de queijo e maçã, com cobertura de chocolate e baunilha. Nada como um doce antes dos frutos do mar – neve de uni com melão confit, um conchão de surf clam com tomate e feijões, uma pratada de amêijoas do tipo littleneck, que chega com um clam chowder clarificado e combinado com nacos de mais dois mariscos finérrimos, a vieira e a navalha, ignorada aqui, prezadíssima como o razor clam, por lá.

 

Ovas de ouriço com melão cantaloupe defumado e iogurte (FOTO Pedro Mello e Souza)

Surf clam com tomates e feijões (FOTO Pedro Mello e Souza)

Alguém pede um tomate no jantar? No Eleven, com certeza, com o recheio do próprio confit, ervas e uma saladinha de lagosta e atum do tipo bonito. Lindo, diriam da combinação delicadíssima, que remete ao frescor de uma niçoise. O tomate não é qualquer um: é um heirloom, nova moda graças a seu frescor de fruta. Para acompanhar, uma salada de lagosta em filé e o shot de uma soda, fresquíssima, também de tomate, uma provocação com cítricos que trazem o fio condutor de todo o jantar: a acidez. Tomaria um daqueles no café da manhã – ou o dia inteiro, na ressaca.


Littleneck, Manhattan chowder, vieiras e navalhas (FOTO Pedro Mello e Souza)

Tomate confit, com atum bonito…

… e a sua “saladinha” de lagostas (Fotos: Pedro Mello e Souza)

As quebras do chef são bem curiosas. Uma delas é a chegada, antes das carnes, de uma autêntica sobremesa, a crème brulée de foie gras, com frutas vermelhas e beterrabas, que chega com uma guarnição de gougères, o verdadeiro pão de queijo. Mandaram-nos parar com nosso vinho. Querendo ou não, viria ali um tokaji. É prelúdio para outra quebra, a da instalação de um moedor de carne à mesa – aquele que conhecemos bem, pesadão, de manivela.

 

Arma-se o circo: uma travessa de cenouras que nem Walt Disney reproduz a cor. E um mosaico de molhos, condimentos, pitadas, geminhas e mostardinhas. Com a quebra longa, é o momento da pergunta: não merece edição? No caso do picadeiro da cenoura, sim. O mesmo com o cherne, que vem a seguir, que vale mais pela textura do que pela decoração da abobrinha, que simula uma escama. Ou ainda pelo ovo de avestruz, que chega com um creme de leite, milho e trufas negras. Cremoso, untuoso, mimoso. Mas editável.


Foie gras brulé, summer berries (FOTO Pedro Mello e Souza)

Ralador, cenoura e condimentos, parte 1 (FOTO Pedro Mello e Souza)

Ralador, cenoura e condimentos, parte 2 (FOTO Pedro Mello e Souza)

O ser humano não aguenta mais, quando inicia-se a segunda metade do menu. No braço do garçom, um brasileiro destacado especialmente para nós, a peça de prime rib maturada, que vão preparar com pós de pimentas, cebolas e gengibres para um resultado rico, de sabor profundo. O pato chega com cerimonial idêntico, mas já pronto, assado com lavanda e funcho, o magret servido em triângulos que facilitam o corte e uma compota de nectarina. O molho que vem junto é de se raspar com o dedo.

 

Uma seção nostálgica toma a parte final da degustação: chega uma cesta de piquenique com uma cerveja I.P.A. feita por encomenda, com uma caixinha de pretzels. A seguir, duas desconstruções, ainda com reminiscências da infância americana: o root beer¸ com o creme de uma raiz, a sassafras; e um cheesecake refeito com morangos e sorbet de… pimentão. Ambos espetaculares.

 

Prime rib maturado a frio e suas pimentas – “au poivre”? (Foto: Pedro Mello e Souza)

Pato assado com funcho e compota de nectarina (Foto:Pedro Mello e Souza)

No fim, um truque de mágica, daqueles que irritam o comensal, frustrado pela jogada bem-feita. Enfim, as cartas leram os sabores dos chocolates ao sal, todos diferentes, do damasco à avelã, que já estavam diante de cada um à mesa. Todas essas cenografias dão um toque lúdico ao fundamental: a cozinha primorosa, feita com seriedade, mas apresentada com humor – e com amor, constatado quando o cliente visita a cozinha.

 

E humor, repito, é ingrediente obrigatório para quem encara quatro horas e quinze minutos de degustação. Para arrematar, tal como na entrada, um pacotinho com um sortimento de gingerbreads – “for your breakfast, perhaps”, em uma assinatura que está virando moda em Nova York.


Relembrando a root beer: sassafras, malte de ovos, baunilha e seltzer (Foto: Pedro Mello e Souza)

Cheesecake de pimentão, morangos, castanha de caju (Foto: Pedro Mello e Souza)

Chocolate, sal e, no meu caso, a avelã (FOTO Pedro Mello e Souza)

 

Os textos com as impressões sobre os demais restaurantes visitados está aqui, em:

Per Se

Le Bernardin

Daniel

Jean Georges

 

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